Alma de Jardineira

segunda-feira, novembro 29, 2010

moviéndose entre espejos

(...)
Oh triste soledad, la del engaño
de creerse en humana compañía
moviéndose entre espejos, ermitaño.

He ido muriendo hasta llegar al día
en que espejo de espejos, soy me extraño
a mí mismo y descubro no vivía

Miguel de Unamuno

quarta-feira, novembro 24, 2010

para que servem meus braços


(...)
Luz de Outono, fria, fria...
Hora inútil e sombria
de abandono.
Não sei se é tédio, sono,
silêncio ou nostalgia.

Interminável dia
de indizíveis cansaços,
de funda melancolia.
Sem rumo para os meus passos,
para que servem meus braços,
nesta hora fria, fria?

Fernanda de Castro, in "Trinta e Nove Poemas"

sexta-feira, novembro 19, 2010

e tudo parecia imenso

(...)
Era uma haste inclinada
sob o capricho do vento.
Era a minh'alma, dobrada,
dentro do teu pensamento.
Era uma igreja assaltada,
mas que cheirava a incenso.
Era afinal quase nada,
e tudo parecia imenso!

(...)

David Mourão-Ferreira

segunda-feira, novembro 15, 2010

hormigas de espanto y licor de lirios

(...)

Amigo,

despierta, que los montes todavía no respiran

Y las hierbas de mi corazón están en otro sitio.

No importa que estés lleno de agua de mar.

Yo amé mucho tiempo a un niño

que tenía cien años dentro de un cuchillo.


Despierta. Calla. Escucha. Incorpórate un poco.

El aullido

es una larga lengua morada que deja

hormigas de espanto y licor de lirios.

Ya viene hacia la roca. ¡No alargues tus raíces!

Se acerca. Gime. No solloces en sueños, amigo.

(...)

Federico García Llorca


quarta-feira, novembro 10, 2010

guardar certos vermelhos


(...)

a noite cai mais cedo e apetece

guardar certos vermelhos da folhagem

e amarelos e castanhos nas ladeiras

de setembro. (...)


Vasco Graça Moura

sábado, novembro 06, 2010

porque tudo é um mistério


importa que o rosto se registe
porque tudo é um mistério
os olhos os caminhos
a gravidade do coração
o alfabeto com que a lembrança se escreve
todo o percurso é uma dor
e um lampejo de júbilo

Irene Lucília Andrade

quinta-feira, novembro 04, 2010

breve alegria e longas odisseias


A lua ignora que é tranquila e clara
E não pode sequer saber que é lua;
A areia, que é a areia. Não há uma
Coisa que saiba que sua forma é rara.
As peças de marfim são tão alheias
Ao abstracto xadrez como essa mão
Que as rege. Talvez o destino humano,
Breve alegria e longas odisseias,
Seja instrumento de Outro. Ignoramos;
Dar-lhe o nome de Deus não nos conforta.
Em vão também o medo, a angústia, a absorta
E truncada oração que iniciamos.
Que arco terá então lançado a seta
Que eu sou? Que cume pode ser a meta?

Jorge Luis Borges, in "A Rosa Profunda"